Caixa de Pandora

terça-feira, 22 de junho de 2010

Crescimento econômico e geração de trabalho decente

Crescimento econômico e geração de trabalho decente





Laís Abramo
Em tempos de crise econômica do modelo neoliberal, é possível pensar em crescimento econômico e geração de trabalho e emprego? Presente em Belém do Pará, no Fórum Social Mundial, o jornal Mundo Jovem entrevistou a socióloga Laís Abramo, Diretora da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil, buscando compreender a relação existente entre estes dois fenômenos sociais.


Laís Abramo,
Diretora da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil.
Endereço eletrônico: brasilia@oitbrasil.org.br


Mundo Jovem: É possível pensar uma relação entre crescimento econômico e geração de trabalho e emprego?

Laís Abramo: Este é um tema muito importante para a OIT, que vem afirmando cada vez mais que a geração de emprego (não apenas de emprego, mas de trabalho decente) tem que ser o centro das estratégias do desenvolvimento econômico de um país. Considerando que o trabalho é condição fundamental para que as famílias, as pessoas não caiam numa situação de pobreza, ou para que possam superar uma situação de pobreza, em se encontrando nela, o trabalho é condição fundamental para uma vida digna. É uma ação pela qual as pessoas se integram na sociedade, exercem sua cidadania, conseguem criar projetos de vida, conseguem garantir o próprio bemestar e o da família. Portanto o trabalho tem que ser o objetivo central das estratégias de desenvolvimento social, porque é através dele que os benefícios do crescimento podem realmente chegar às pessoas.


Mundo Jovem: Mas ainda vivemos uma realidade de muito desemprego?

Laís Abramo: Se a gente for falar no antes desta situação econômica, desta crise financeira com a sua derivação na economia real, existiam 195 milhões de pessoas desempregadas no mundo. E, além disso, do volume de pessoas que trabalhavam, que tinham algum tipo de emprego/ocupação, a metade era pobre, recebia menos de dois dólares por dia, que é a linha de pobreza. E quase 20% eram extremamente pobres, de receber até menos de um dólar ao dia. Então, isso é uma evidência de que não é qualquer tipo de ocupação que é suficiente.

Quando se fala em geração de emprego, é necessário pensar também na qualidade do emprego. Verificou-se uma situação de crescimento, prosperidade, em termos mundiais, na América Latina e no Brasil, mas há uma evidência de que os benefícios não estavam sendo distribuídos igualmente, justamente porque faltavam oportunidades de trabalho decente ou, como dizem os dados, existe um déficit de trabalho decente.


Mundo Jovem: E o que é trabalho decente?

Laís Abramo: Trabalho decente é produtivo, remunerado, exercido em condições de liberdade e segurança; o que seria capaz de produzir uma vida digna. Quando a OIT define este conceito como a sua grande “bandeira”, ela não inventa nada de novo, porque a noção de trabalho decente com possibilidade de acesso à vida digna é uma noção que está na base da constituição dos grandes movimentos democráticos sociais desde o século 19. Está na base da criação do movimento sindical, da criação das instituições, do mercado de trabalho e dos estados democráticos no geral.

Então, quando a OIT sintetiza através dessa ideia de trabalho decente, seu mandato histórico, que é de promoção de mais e melhores empregos, garantia do direito ao trabalho, de proteção social, ela está justamente querendo reforçar essa noção, colocar isso no centro de seus objetivos.


Mundo Jovem: Esse conceito vai além da noção de emprego de qualidade?

Laís Abramo: É justamente isso. A grande ideia do trabalho decente diz o seguinte: não é suficiente gerar postos de trabalho, mas é fundamental que os postos de trabalho, que as oportunidades de ocupações estejam acompanhadas por um nível aceitável de qualidade em termos de salário, condições de saúde etc. Mas que esteja também indissoluvelmente associadas à noção de direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, de proteção social e da ideia de que os autores do mundo do trabalho têm direito de se organizar, de se expressar, e também têm a responsabilidade de criar espaços de diálogo social para pensar conjuntamente nos problemas do mundo do trabalho.

Uma outra concepção central é a noção de equidade, que deve ser um eixo transversal de todos os sistemas, empregos, direitos, diálogo social e uma ênfase especial na questão de igualdade de gêneros. No caso do Brasil, da América Latina, nós também crescentemente trabalhamos com a noção de igualdade racial e étnica, e consideramos que a desigualdade de gênero e desigualdades étnico-raciais são eixos fundamentais estruturantes dos padrões de igualdade social, num continente que não é o mais pobre, mas é o mais desigual do mundo.


Mundo Jovem: Qual é o papel do Estado quando se fala de crescimento econômico e geração de emprego?

Laís Abramo: O papel do Estado é muito importante. Nós estamos saindo de um período marcado por um pensamento hegemônico, que justamente colocava no Estado quase todos os males...

O chamado Consenso de Washington, o pensamento neoliberal, foi o que orientou a política internacional nas últimas décadas, justamente pregava um afastamento do estado e a ideia de que o mercado por si só seria capaz de garantir o crescimento econômico e garantir o bem-estar das pessoas.

Existiam nos estados e nas políticas, na forma como o estado administrava o capital muitos problemas, e isso no Brasil, na América Latina, em vários países do mundo. Mas a solução de propor a retirada do Estado é uma solução irreal, que não resolve. E o que se evidencia nesta crise econômica é justamente o que levou este tipo de modelo econômico ao auge da desmobilização dos mercados financeiros, que está criando um prejuízo enorme para o mundo inteiro.


Mundo Jovem: Os jovens sofrem mais o problema do emprego precário e do desemprego?

Laís Abramo: Existe uma polêmica a respeito de qual seria o momento ideal para que o jovem entre no mercado de trabalho. É uma polêmica aberta. Penso que seria quando o jovem completa sua escolarização, pois existe uma exigência cada vez maior, numa trajetória de trabalho decente para a juventude ou para as pessoas. A base, sem dúvida, desta trajetória é a educação, a escolarização. O mercado de trabalho está cada vez mais exigente.

Outra questão muito difundida é a de que os jovens não necessitam tanto assim que sejam respeitados os direitos no trabalho, porque estão mais dispostos a aceitar emprego precário, informal, sem proteção.

O resultado disso é que você tem em todos os países índices de precarização na juventude superiores à da população adulta. Há também um outro percentual preocupante que é o dos jovens que não estudam e não trabalham: estão na inatividade. Em 2007 se fez um estudo sobre a situação da juventude na América Latina, que mostra que existem 22 milhões de jovens, entre 15 e 24 anos, nessa situação. Destes, 72% são do sexo feminino. Isso considero uma discussão central de qualquer agenda de trabalho decente que se pretenda fazer.

Na agenda hemisférica de trabalho decente que foi lançada em maio de 2006 existe uma meta que é diminuir pela metade o número de jovens que não estudam e nem trabalham. No caso do Brasil, está se trabalhando nisso também.


Mundo Jovem: Também entre os jovens a questão de gênero é um fator de exclusão?

Laís Abramo: Um dado, sem dúvida, que chama muito a atenção é que 72% do total de jovens que não estudam e nem trabalham são mulheres. E aí entra o fator da maternidade na adolescência. Muitas adolescentes, ao engravidarem, acabam saindo da escola. Não existem políticas, por um lado, preventivas, que evitem a maternidade precoce. Depois, não existem políticas de conciliação trabalho-família, escola-família, que no caso das jovens adolescentes que têm filhos, facilitem para que elas continuassem estudando e/ou trabalhando.

Além disso, algumas adolescentes acabam sendo responsáveis por cuidar da casa, cuidar dos irmãos menores, enquanto a mãe está trabalhando. Aí entra a particularidade da questão do gênero, numa cultura que atribui às mulheres a responsabilidade do cuidado com a família e isso compromete de maneira muito direta as mulheres jovens.


Mundo Jovem: Como superar esse quadro?

Laís Abramo: Existe uma decisão do governo junto à OIT de tentar construir uma Agenda Nacional para a Juventude, que seria coordenada, do lado do governo, pelo Ministério do Trabalho e pela Secretaria Nacional da Juventude, ligada à Secretaria Geral da Presidência, incluindo uma participação ativa dos movimentos sociais, para propor ações em diferentes áreas.

Acredito que o momento atual de crise econômica mundial renova a necessidade de enfrentar a crise, se defender de seus efeitos negativos, mas também discutir os fundamentos do modelo que geraram essa crise e pensar na superação desse modelo econômico, na sua transformação.

Capital social: um ingrediente a ser considerado

A aplicabilidade das políticas neoliberais globalizantes trouxe relações verticais autoritárias, impostas pelas leis do mercado, que obtiveram crescimento econômico pouco significante. Consequentemente, levaram a um agravamento dos problemas sociais em boa parte dos países latino-americanos. Como resposta, suscitou a criação e o fortalecimento de antigos e novos movimentos sociais contestatórios, que passam a utilizar os benefícios do capital social, proliferando relações horizontais de confiança mútua, redes de cooperação, associativismo e voluntarismo.

Desta maneira, o capital social tem sido um instrumento eficiente para se contrapor à hegemonia da política econômica e, aos poucos, indicar novas relações sociais que direcionam para um novo modo de agir, mais solidário e participativo, fortalecendo a sociedade civil e o processo democrático.

Ao mesmo tempo em que se constata uma desilusão com o desempenho da democracia, bem como um elevado descrédito e uma desconfiança dos cidadãos frente ao desempenho dos governantes e instituições políticas, nada melhor que, através do capital social, pensar estratégias que recuperem a credibilidade das instituições frente às demandas e exigências dos cidadãos contribuintes.

Neste sentido, há uma conclusão geral aceita no meio acadêmico de que a consolidação e solidez da democracia de um país dependem de uma sociedade civil dinâmica e participativa, orientada para a valorização das normas democráticas, baseada na ética, na moral e nos costumes.


Dejalma Cremonese,
cientista político, professor no Departamento de Ciências Sociais e
do Mestrado em Desenvolvimento, da Unijuí, RS.
Endereço eletrônico: dcremo@hotmail.com
Site: www.capitalsocialsul.com.br



Após a leitura da entrevista Laís Abramo,Diretora da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil. Responda aos questionamentos.

1)Por que o trabalho tem que ser o objetivo central das estratégias de desenvolvimento social?

2)O que você compreende por "vida digna" e "trabalho decente"?

3) Qual a diferença entre trabalho decente e ocupação?

4) Qual seria o momento em que o jovem deve ser inserido no mercado de trabalho?

5)"Há também um outro percentual preocupante que é o dos jovens que não estudam e não trabalham: estão na inatividade. Em 2007 se fez um estudo sobre a situação da juventude na América Latina, que mostra que existem 22 milhões de jovens, entre 15 e 24 anos, nessa situação. Destes, 72% são do sexo feminino." Comente a afirmativa.

6) " Um dado, sem dúvida, que chama muito a atenção é que 72% do total de jovens que não estudam e nem trabalham são mulheres. E aí entra o fator da maternidade na adolescência. Muitas adolescentes, ao engravidarem, acabam saindo da escola. Não existem políticas, por um lado, preventivas, que evitem a maternidade precoce." De que forma vocês percebem este fato no nosso município?

7) Após leitura da entrevista que relação você faz entre a situação apresentada e o emprego/desemprego em nosso município?

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